domingo, setembro 25, 2016

Conversas à fogueira





Ainda me recordo dos serões, à lareira, em casa dos meus avós maternos. O meu avô Palma era um exímio contador de historias tradicionais e inventadas, mas nem por isso menos lindas. As conversas eram sempre animadas... era a família, os moirais e os almocreves... e, por vezes tb o sapateiro que uma vez por ano lá passava, uns tempos, a fazer sapatos para o pessoal, ou até o cardador ... Era assim, há 50 anos...uma casa animada, cheia de vida.
Não tínhamos nem TVs, nem Ipads, nem Iphones, nem PCs... mas só ganhámos com isso, porque tínhamos outras coisas que não custavam dinheiro, mas não tinham preço... 

É provável que contar e ouvir histórias pela noite dentro tenha contribuído para a imaginação e empatia dos primeiros humanos e que as conversas à fogueira tenham mesmo estimulado a evolução das nossas capacidades cognitivas, sociais e culturais.
 À noite, as pessoas descontraíam, acalmavam e procuravam entretenimento. Era um momento universal para formar laços, difundir informação social, para se entreter e partilhar emoções. 

 Agora, o trabalho e o lazer, estendem-se pela noite dentro, em casa, em frente a um computador. Os avós nos lares, os pais sem tempo, os filhos sem paciência...
 O que acontecerá às relações?!... 

O Fiat Necker do meu pai / 1965

Descobertas, que eu adoro, vindas lá do fundo do baú.
Esta foto é de 1965, à porta da casa dos meus pais.
- A velhinha camioneta da Rodoviária que vinha de Beja, passava a Alcoutim e seguia para Vila Real de Sto António... seriam 10 horas da manhã, esse era o horário da chegada a Alcoutim.
- O giraço do carro do meu pai... um Fiat Necker, de cor beje e capota castanha. O meu pai vendeu-o ao Guarda Fiscal Sr António José Galrito e o filho diz-me que está velhinho, mas ainda existe... Que fixe!!!
Os cestos e canastras, no tejadilho "da camioneta", ninguém lhe chamava autocarro..., íam cheios de produtos que a terra dava... rumo ao litoral, para onde tinham migrado os filhos... em busca de melhores condições de vida.
Estas encomendas, cestos e canastras, eram despachadas na casa dos meus pais, que eram tb agentes da Rodoviária. Os cestos tinham a respectiva tampa, mas às canastras, sem tampa, era cosida uma "tampa" de serrapilheira, com uma agulha enorme e curva...
Mais tarde regressavam vazios... para depois voltarem a ir cheios...
Era assim, na década de 60...

 Foto a cores, muito rara nessa época. Foi obtida pelo Dr. Eckart Frischmuth, jovem alemão, que nessa data estava em Alcoutim, fazendo um trabalho de geología para apresentação da sua tese de doutoramento. Faz parte de uma colecção de "slides", que só muito recentemente foi convertida para digital./ José Serafim.

quarta-feira, setembro 14, 2016

ALCARIA ALTA - um monte nointerior algarvio.

Tenho uma vontade enorme de abalar para o nordeste, e ficar lá uma temporada, agora que me chegou às narinas o cheirinho da terra molhada...
A casa humilde dos meus avós paternos, bem lá no alto e com uma vista fantástica, fica no Castelo. O Castelo é um dos "bairros" do Monte.
São 7... como as colinas de Lisboa: o Castelo, a Praça, a Ponta do Monte, o Reguengo, o Além, o Rossio e a Portelinha.
A Casa do Monte é um espaço quentinho no Inverno, mercê da lareira que aconchega... e fresco no Verão, porque há sempre uma brisa, um ventinho suave soprando em volta.
Só se ouvem os pássaros, o zumbido dos insectos, vozes distantes, um latido ou um miado e o barulho suave dos aviões que passam lá no alto, na sua rota para as Américas.
De lá, os nossos olhos abarcam uma imensidão, quando é dia... e perdem-se na observação de miríades de astros, quando é noite... Acontece-me adormecer no poial exterior, contemplando o Céu e recordando as histórias que ouvi, em menina, à luz da lua e das estrelas.
Foi lá que recebi os primeiros ensinamentos sobre os astros e aprendi a descobrir as Constelações... Ursa Maior, Ursa Menor, Cassiopeia, Orion... ainda hoje as procuro e falo com elas, como me ensinou o meu tio Vanderdil.

Tudo é gratificante.
Avivam-se as lembranças, e também os sentidos, no recordar do cheirinho do pão acabado de fazer... na visão das sardinhas alinhadas, pela minha avó, no tabuleiro saído do forno comunitário, no degustar divinal dos figos da Índia que sempre me aguardam, apesar de estarem já muito maduros em Setembro... nas alfarrobas que eu "roubava" das manjedouras, já meio comidas pelos animais, mas que me sabiam tão bem e que agora apanho da árvore e me regalo com aquele sabor docinho, nos meus passeios matinais, nas fragrâncias que a Mãe-Terra me oferece.
Estou a ultimar-me... quase, quase a abalar... Se alguém quiser uns dias de sossego... e algum trabalhinho também, faça favor!... Há alfarrobas e amêndoas para apanhar... e figos da ìndia para degustar.
Agora que já não pode calcorrear pelas ruelas do Monte, e tudo lhe traz saudades de tempos de felicidade que se foram, nem sempre a minha Mãe me quer acompanhar, mas vou tentar que desfrute o melhor possível aquele sossego, desta vez faço mesmo questão que se entusiasme também e me diga que sim... que vai.