quinta-feira, outubro 28, 2010

A minha AVÓ ISABEL

Sempre a conheci assim, de negro vestida. Enviuvou antes de eu nascer e, posteriormente, perdeu o filho mais novo, o meu tio Vanderdil, com 35 anos de idade. Cem anos vivesse que sempre de preto se vestiria. O preto simbolizava a dor, a ausência, a saudade dos que haviam partido...marido e filho.
Quando era miúda adorava dormir com a minha avó, bem aconchegada a ela, aquecidas com as mantas de montanheco/de pura lã de ovelha e tecidas lá em casa no velho tear do meu avô Baltasar. Lembro-me dos Invernos ventosos, da chuva a bater nos telhados, das histórias de vida que me contava enquanto o sono não chegava.
Contava-me que o meu avô assinava um jornal que chegava ao monte pelo correio. Depois de passada a palavra de que o jornal chegara, toda a vizinhança confluía para o Castelo (era assim que se chamava a zona mais alta do monte) onde os meus avós moravam.
Mais tarde, seria outro o meio de comunicação que traria as pessoas ao castelo... um rádio comprado pelo meu pai, receptor de notícias faladas, sinal da evolução dos tempos.
Quando, anos mais tarde, fomos morar para Alcoutim e regressávamos ao monte, em visita, lembro-me de a ver, sempre, no canto do muro do quintal esperando por nós... Quando o carro passava a portela, os seus excelentes ouvidos davam conta e ela apressava-se a ir ao sítio onde a minha mente, mil vezes a visualiza... para ver se seriam os seus. Guardo esta imagem como se fosse ontem...

4 comentários:

Maria dos Anjos disse...

Quiz o acaso (?) que descobrisse o seu maravilhoso blog. Fiquei de tal maneira encantada que li tudo o que publicou desde o início.
Em muitas das situações que descreve, também eu me revi.
Conheço bem essa bonita terra e muitas vezes fiz paragens nos locais que refere.
Também nasci (em 1953) à beira do encantador Guadiana - Almada de Ouro e com 8 anos fui viver para Faro onde estudei. (Por curiosidade vivia na mesma rua do Francisco Amaral que é um pouco mais novo do que eu e as nossas mães conheciam-se bem). Durante a adolescência todas as férias eram passadas na minha terra natal e a vivência desses dias foi idêntica à que descreve.
Depois fui estudar para Lisboa, onde me licenciei em Biologia. Sonhava voltar para as terras do Sul...
Mas a vida não o proporcionou e ainda continuo em Lisboa. Sou professora numa escola secundária.
Todas as férias e sempre que me era possível, rumava para as minhas origens e era por Alcoutim que o fazia pois era a forma de usufruir ao máximo daquele que considero o "meu rio".
Durante a infância dos meus filhos dividia o período de férias de Verão entre Faro e Alcaria - Odeleite, de onde a minha mãe é natural. Lembro-me de o meu pai (Sebastião da Palma, falecido há 5 anos) falar em muitos amigos de Alcoutim, entre os quais o nome do seu pai. De Giões tenho bonitas mantas e alforges e o meu pai dizia que tinha lá umas primas.
Possivelmente até nós nos conhecemos... mas os anos apagam muitas das memórias.
Como se pode perceber, gostei muito de tudo o que publicou e foi como se lesse um pouco da minha própria estória de vida.
Transparece, em tudo, uma sensibilidade especial - própria de quem teve experiências de vida muito ricas e... à beira do Guadiana! PARABÉNS!
Um sincero abraço e bem-haja!
(Continuarei atenta às próximas postagens)

Odíli@ Guerreiro disse...

Crescendo onde diz que cresceu proporcionou-lhe viver em pleno aventuras maravilhosas muito similares às minhas que morava a 100 metros dele... Só vc me entenderá quando falo daquele cheiro do rio nesse tempo, daquele cheiro único e isento de poluição, um cheiro que hj não existe mais... De certeza que os seus pais conheciam os meus. Tínhamos o único Café da praça que era, como nos áureos tempos de Roma, o fórum da pequena vila!!! Hei-de falar do nome do seu pai à minha mãe. Tb sou Palma, do lado materno.
Obrigado pelas palavras e obrigado por seguir o meu blogue. Obg e bem haja!...

JORNAL RAIZONLINE - SEPARATA disse...

Tenho uma recordação bastante presente do seu tio (?) Vanderdil e da sua presença bastante frequente numa laje enorme (rocha)que tinha uma vista sobre a parte baixa do Monte até à Portelinha (?) que era o portal do caminho para o Monte das Velhas. Por vezes ainda miúdo juntava-me a ele e conversámos bastante.

Sabia que ele era doente mas nunca soube exactamente de quê...coração diziam-me...mas ele ficava até muito tarde nessa mesma pedra,sentado ou encostado, dizia a minha mãe que era porque ali tinha bons ares e que se sentia melhor.

Pessoa simpática veio-me à memória agora que a li...o que fixei mais foi também a originalidade do nome: dizia a minha mãe que era uma aglutinação de um nome de um oficial holandês (Van Der Dill)...seria mesmo?!

Daniel Teixeira

Carlos Patrício disse...

Texto muito bonito e muito sugestivo.
Gostei tanto que passarei a ser visita frequente.
Parabéns!