A Escola situava-se a nascente da Praça da República, o Rio ao fundo e Sanlúcar mais além. O nosso recreio era toda a Praça... na Rua do Município, do lado esquerdo a seguir à Câmara era a minha casa, inicialmente, porque depois mudámos para a casa nova , a poente da praça, pouco depois de o meu irmão nascer.
Actualmente a Praça está diferente - mais moderna, mais acolhedora. As casas que a ladeavam foram dando lugar a edifícios mais altos. Restam apenas o Edifício da Câmara, a casa dos meus pais e a velha Escola que, há muito deixou de vibrar ao som dos risos e gargalhadas dos miúdos, dado que outra foi construída, há muitos anos, na parte de cima da Vila.
Não é só a Praça da República que está hoje mais bonita, também a minha Escola foi recuperada, por fora e por dentro, mantendo-se a traça de outrora.
Perco-me a olhar para ela... desfio muitas recordações boas e algumas menos boas - que também as houve...
Naquele tempo, como já disse noutro post, a régua trabalhava!!! Foi pena!... Não fosse isso e as reminiscências seriam, todas elas, divinais...
Há pouco tempo, em Setembro voltei a ver a minha primeira professora a D.Adélia. Uma boa professora, uma boa amiga que nos acompanhou ao longo de 2 anos. Dela guardo as melhores recordações desse tempo. no final da minha 2ª classe, como então se dizia, concorreu e foi viver para Olhão e eu senti-me um pouco abandonada... Veio depois outra professora, a D. Mª Antónia, para o seu lugar vazio...
Era muito o que tinhamos que aprender nos últimos 2 anos da primária:
Matemática - saliento os terríveis problemas das torneiras que pingavam horas a fio e quanto mais pingavam maiores eram as contas..., as áreas daqueles terrenos enormes que só havia no Alentejo, e que muitas vezes tínhamos que cercar com 6 fiadas de arame de 2$00 o metro... as multiplicações e divisões com números de meter medo que nunca consegui entender para que serviam, nem hoje consigo..., a História de Portugal, 4 dinastias - Afonsina, de Avis, Filipina e Bragança - 34 Reis com um ou mais Cognomes que nos obrigavam a fixar - D. Afonso Henriques o Conquistador, o Fundador, o Grande... D. Dinis o Trovador, o Lavrador, o Poeta, o Rei-Agricultor... D. Pedro I o Justiceiro, o Cruel, o Cru, oVingativo, o Tartamudo, o Até-ao-Fim-do-Mundo, o Apaixonado..., D. Manuel o Venturoso ou Bem-Aventurado, D. Sebastião o Desejado, o Encoberto, o Adormecido... Os nomes e as datas e quem comandava as tropas, de um lado e de outro, nas inúmeras batalhas contra os Mouros, Castelhanos, invasores Franceses, etc... Os Tratados, as Terras descobertas, as Conquistas... E a Geografia de Aquém e de Além-mar em África - as Linhas de Caminho de Ferro, as Serras, os Rios e afluentes... enfim!!! Uma loucura de matéria para crianças tão pequenas!!! Nem sei como não tinhamos esgotamentos... Não tínhamos porque ainda não era moda essa doença, do foro psiquiátrico, que haveria de surgir anos mais tarde...
Sempre fui boa aluna, no entanto, a contas de uma malfadada conta de multiplicar também experimentei as carícias da Sra D. Palmatória uma vez, uminha só... como já contei neste blogue. Nunca esqueci, mas já perdoei a injustiça...(se ainda continuo a falar dela é porque a coisa ainda não está bem resolvida..., diria hj o Psicólogo da Escola).
Havia alguns alunos que eram, diariamente, castigados porque ou erravam as contas, ou falhavam as Tabuadas, esqueciam a data da tal batalha ou o afluente daquele rio no norte de Moçambique ou ainda porque não faziam a mais pequena ideia do percurso da linha de caminho de ferro de Benguela em Angola... Quanto aos erros ortográficos - era uma palmatoada por cada erro...
Fiz exame de admissão ao Liceu e, em Outubro de 1963, passei a frequentar o Liceu Nacional de Faro e a integrar a turma J onde era o nº 34. No total eramos 39 alunas... Usávamos bata branca, com uma fita verde presa com 2 molas. ( era o distintivo do 1º ano... no 2º vermelha, 3º cor de rosa, 4º amarela, 5º azul que punhamos bem escuro para confundir com o preto que era a cor do 7º ... e o 6º era castanha.)Tive saudades da pequenês da minha Escola, saudades que foram passando à medida que me fui ambientando e criando novas amizades.
Nunca mais vivi 365 dias seguidos em Alcoutim... mas o cordão umbilical nunca foi, completamente cortado... Continuo presa, às raízes...
3 comentários:
Belas recordações! Continuas ligada, sentimentalmente, a essa terra nas margens do Guadiana...tens a sorte de possuir fotos desses tempos que te ajudam a localizar melhor vivências da tua infância.
Cá estou, como prometi, a ler, deliciada, mais um seu bonito post. Ao ler as suas memórias desse tempo, desfilam no meu pensamento as minhas. Fiz a 2ª classe na escola do Azinhal (a antiga, no centro da aldeia) e nunca experimentei a célebre régua, mas, em contrapartida, passei por uma humilhação que para mim foi muito pior:
Tinha uma amiga, a Mª da Glória, que todos os dias era premiada com reguadas por não saber a tabuada. Um dia decidi colocar-me estrategicamente atrás dela para lhe "cantar" em voz baixa a dita e ela ia repetindo em voz alta. A D. Emília, a professora da 1ª classe, claro que se apercebeu disso. Nesse dia a minha amiguinha não teve o habitual "prémio", mas eu fui colocada junto da secretária da professora e, à frente de todos levei uns grandes puxões nas minhas belas tranças enquanto a sra dizia: "nunca mais dizes a tabuada nem à Mª da Glória nem a ninguém". Depois todos saíram e eu fiquei de castigo fechada na sala. Anoiteceu e a professora, que timha ido para casa, esqueceu-se de mim. Tive tanto medo. Nessa altura vivíamos em Almada de Ouro e eram muitas as crianças que andavam na escola primária mais uns 3 rapazolas de 12/13 anos que estavam a ser preparados pelo Sr Simplício para o exame do 2º ano do liceu. Entre eles o meu irmão. Quase a meio do caminho, o meu irmão apercebeu-se que eu não estava no grupo e voltou, sozinho, para o Azinhal. A certa altura comecei a ouvir o meu irmão chamar-me e a dizer-me para saltar pela janela pois a porta estava fechada à chave. Depois da muita insistência dele, venci o medo da professora e saltei. E os dois, a pé, lá fizemos os 4 Kms para Almada de Ouro no meio da noite bem escura.
Este incidente nunca foi comentado pela professora nem pelos meus pais. Mas eu ainda tenho todas as sensações dessas longas horas bem presentes. Fora isto hoje...
As 3ª e 4ª classes já as fiz na escola primária de S. Luís em Faro. Foi nesta altura que eu senti as saudades da vida simples e extremamente rica do campo. Em 63 entrei para o 1º ano do liceu de Faro - era a nº 26 da turma F, de 40 alunas. O meu irmão frequentava, então, o 6º ano.
Um abraço
Engraçado o facto de termos estado tão perto, vc na F e eu na I... c/ os mesmos professores, decerto. A sua amiga Mª da Glória irmã da minha amiga Ana Maria...elas eram 4, o Sr Simplicio meu grande e saudoso amigo... tanta coincidencia, ou não!!!
Meu mail: mariaodilia53@hotmail.com
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