O dia estava chuvoso e feio, mas foi bastante agradável. De regresso passei pelo monte e embrenhei-me pela freguesia de Vaqueiros rumo ao concelho de Castro Marim.
Não conhecia esta estrada nem outras que partem de Vaqueiros, pela serra abaixo, até ao litoral. Estamos tesos e sem dinheiro, mas estou como diz o outro: ficámos com a obra feita!!! As populações do interior serrano bem precisavam destas vias de comunicação.
Em Alta Mora "conheci o salão de baile" onde íam dançar os rapazes de Alcoutim. Nós, as raparigas, não tínhamos essa sorte. Já era outro concelho e os tempos eram outros...Ficávamos roídinhas de inveja porque as outras íam ter, de mão beijada, os moços mais lindos das redondezas, que eram os "nossos", e nós... tristinhas até ao regresso deles. A não ser os da nossa terra só tinhamos permissão para ir ao baile das Quatro Estradas... a 8 km.
Portanto " conheci o baile" com 40 anos de atraso...
O que foi um salão de baile é hoje uma moderna habitação. Nada a fazer lembrar os tempos idos, apenas a recordação persiste nas memórias de cada um.
Como tenho uma imaginação prodigiosa, fecho os olhos e visualizo tempos idos...
A noite é escura como breu. Aqui e ali, balanceiam alguns lampiões, ao sabor dos passos de quem os transporta. Vejo raparigas chegarem ao baile acompanhadas da mãe, da tia ou de uma vizinha de confiança, que também traz a filha - é preciso manter o cerco apertado, estar vigilante pois há o perigo de o atacante/rapaz desferir o golpe na presa/rapariga ao mais pequeno descuído...
Já na sala do baile, rapazes e raparigas sem conta, (pois era o tempo em que os casais faziam filhos com fartura), rodopiam ao som de uma valsa.
No palco improvizado, o acordeonista faz o que uma orquestra inteira não consegue fazer hoje - chama à pista dezenas de pares logo aos primeiros acordes... (Hoje, a sua maioria encosta ao balcão e bebe)...
De repente, o Petromax avaria-se ou alguém provoca um apagão... (às vezes acontecia, aliás, muitas vezes acontecia)... A felicidade é total, ouve-se um burburinho de contentamento na pista, as vigilantes levantam-se aflitas e de coração acelerado, chamam por esta e por aquele..., mas nada podem fazer.
A sala fica por momentos na escuridão. Dá-se azo aos prazeres proibidos que não eram NADA a comparar com o que se faz hoje, de luz acesa.
Alguns rapazes, os de menos sorte e muita inveja, acendem isqueiros aqui e ali e lentamente a sala ilumina-se e o problema também, rapidamente, se resolve.
A chuva e o vento acalmaram e é hora de descer à terra...
Estou cada vez mais presa à simplicidade do Nordeste algarvio... pudesse eu e ficava lá, sempre. Assentava arraiais na calma e no sossego...e só vinha à cidade matar saudades da família.
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