Ainda me recordo dos serões, à lareira, em
casa dos meus Avós Maternos.
O meu Avô Palma era um exímio contador de
historias tradicionais ou inventadas, mas nem por isso menos lindas. Quase nos consigo ver, os 3 netos, maravilhados com cada palavra que, pausadamente proferia... Há uns anos atrás estive nesta casa do fogo, que não me pertence, mas a uma familiar. Já não exise, mas consegui vizualizar “noiva” (uma pedra branca, em forma de cubo, onde eu adorava sentar-me, junto ao 'fogo de chão' e o meu Avô Palma com os outros 2 netos, nos joelhos.
Quase consigo ouvi-lo : “Toca, toca pastorzinho... toca, toca com vigor…” do
conto do Pastor e da Flauta... Foi uma infância feliz, a minha!...
Também as conversas, entre adultos, eram sempre animadas. Muitas vezes, também participavam os moirais e os
almocreves, o sapateiro... que uma vez por ano lá permanecia,
por uns tempos, a fazer sapatos, ou até o cardador ... Eram serões muito animados. Muitas estórias de vida, de experiências, de muito ensino e aprendizagem...
De Inverno, à lareira... de Verão, à luz das estrelas...
Em casa dos meus Avós Paternos, havia menos movimento..., não conheci o meu Avô que partiu antes de eu nascer, mas com o meu tio, que vivia ainda com a minha avó, aprendi, desde novinha, a olhar para o Céu... ensinou-me a descobrir as estrelas, os planetas e as constelações, no Universo, que nos envolvia.
Não havia luz eléctrica e, nos dias de calor, sentados nos poiais, na rua, entre uma conversa e outra, olhávamos para o céu... Olhar as estrelas é privilégio das gentes do campo. Nas cidades
não existe esta possibilidade. Falta lugar cómodo e sobram as luzes que
tiram tanta nitidez ao firmamento.
A minha avó, por sua vez, faláva-me da infância do meu pai e dos meus tios, de como ele era aplicado na Escola e dos receios que tinha quando eles abalavam, para a aldeia, a pé...
Eram uns bons 5 km para lá, outros para cá..., para aprenderem a ler e a escrever. Este meu tio faleceu aos 35 anos (tinha eu 5) e, a partir daí, nas minhas férias, acabou a alegria e vieram as conversas de muito amor e muita saudade, pelo marido e pelo filho que já não estavam entre nós. Voltou a tristeza àquela casa, e eu dei conta da mudança. Também senti a falta deste meu tio. Era a minha referência, o meu herói em tempo de férias...
Sempre achei que contar e ouvir histórias de vida, ou da carochinha, ou outras, pela noite dentro, tenha contribuído para desenvolver a
nossa imaginação e empatia e que as conversas à fogueira tenham mesmo estimulado a evolução das nossas capacidades cognitivas, sociais e culturais. À noite, as pessoas descontraíam, acalmavam e
procuravam entretenimento. Era um momento universal para formar laços, difundir
informação social e partilhar emoções.
Era assim, há 50 anos... casas plenas de acontecimentos e de vida.
Não tínhamos TVs em casa dos avós, nem Ipads, nem Iphones, nem PCs... mas só
ganhámos com isso, porque tínhamos outras coisas que não custavam
dinheiro, mas não tinham preço...
Agora, o trabalho e o lazer estendem-se pela noite
dentro, em casa, em frente a um computador. Os avós nos lares, os pais sem tempo, os filhos ...
O que acontecerá às relações?!...